A ESCOLA DE FRANKFURT E OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA
A ESCOLA DE FRANKFURT E OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA
por Alexsandro M. Medeiros
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postado em out. 2025
Em 1923, um grupo de intelectuais, filósofos e cientistas sociais fundou o Instituto de Pesquisa Social na cidade de Frankfurt, na Alemanha, razão pela qual esse grupo ficou conhecido como sendo parte da Escola de Frankfurt.
Os teóricos da Escola de Frankfurt vivenciaram alguns dos principais acontecimentos do século XX: as duas grandes guerras de proporções mundiais, o avanço dos governos totalitários na Europa (nazismo, fascismo e stalinismo), a multiplicação dos meios de comunicação, a proliferação da sociedade de massas, a sociedade industrial e problemas decorrentes do processo de desenvolvimento do Capitalismo.
Neste texto iremos abordar de forma mais específica o modo como a Escola de Frankfurt e, mais especificamente, Adorno e Horkheimer, viam os meios de comunicação de massa e sua relação com a Indústria Cultural e o sistema capitalista que produz bens culturais (filmes, música, TV) como mercadorias para obter lucro e manter o controle social e político. “A expressão Indústria Cultural (Kulturindustrie) foi cunhada pela primeira vez em 1947, por Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, nos fragmentos filosóficos reunidos sob o título de Dialética do Esclarecimento” (Costa, 2013, p. 135).
Ao invés de promover a emancipação, essa indústria fortalece a dominação, socializando as pessoas com valores capitalistas e tornando-as consumidores passivos, em vez de cidadãos conscientes. Adorno e Horkheimer, analisaram como a tecnologia, quando não é usada para a libertação, mas para o lucro, leva à subjugação e à conformidade. Os frankfurtianos analisaram como a racionalidade técnica, em vez de libertadora, pode se tornar um instrumento de controle. Em outras palavras, abordaram os fenômenos da comunicação de massa na perspectiva de que os instrumentos tecnológicos tem um potencial massificador, são meios de manipulação e de reificação das consciências.
A comunicação de massa é um fenômeno que se intensificou com a industrialização e a urbanização, já que a troca de informações deixou de ser apenas pessoal para se tornar intermediada por veículos de comunicação que conseguiam assim veicular suas mensagens para um público vasto e disperso. A principal característica é a comunicação de um “emissor” (como uma emissora de TV ou um jornal) para “muitos receptores” ao mesmo tempo, ou seja, são as comunicações que são destinadas a alcançar um grande público através do jornal, rádio, cinema, televisão e a internet.
A influência dos meios de comunicação de massa é enorme e molda a nossa sociedade de várias formas, seja através da informação (como fonte de notícias sobre política, economia, cultura e outros assuntos), de entretenimento (oferecendo uma vasta gama de conteúdo, desde filmes e séries até programas de rádio e música) e até de formação de opinião (com um poder inclusive de influenciar a opinião pública).
A partir da década de 1920, primeiro o rádio e, depois, a televisão, se tornaram os meios de comunicação mais eficazes na efetivação da comunicação de massa. Os nazistas, por exemplo, usaram a propaganda e os meios de comunicação como o rádio para mobilizar as massas, demonstrando o poder desses instrumentos em mãos de regimes autoritários. Alguns dos pensadores da Escola de Frankfurt, que eram judeus, se viram alvos da campanha nazista, com apoio da máquina de propaganda e utilizando em larga escala os meios de comunicação como instrumentos ideológicos.
É nesse cenário que encontramos algumas das principais reflexões da Escola de Frankfurt, através de pensadores como Adorno e Horkheimer que tinham uma visão bem pessimista a este respeito, ao enfatizar que os meios de comunicação de massa interferiam negativamente na formação do sujeito. “Adorno e Horkheimer irão entender o modelo de radiodifusão (radio, tv e cinema) como uma prática fascista [...] Diante da tv o sujeito não é independente e reflexivo, mas inconsciente e massificado” (Gomes, 2010, p. 59).
Ao contrário de Adorno e Horkheimer, um outro filósofo da Escola de Frankfurt, Jürgen Habermas, “terá uma visão menos pessimista sobre o papel da mídia. Para ele os meios de comunicação podem ser usados para potencializar a ação comunicativa, pois só a comunicação pode levar ao entendimento e esclarecimento” (Gomes, 2010, p. 67). Habermas,
ressalta a possibilidade do sujeito resistir, questionar, as mensagens emitidas pelos meios de comunicação de massa [...] entende que não há, necessariamente, determinismo da mídia sobre os agentes e, além disso, aponta a possibilidade de formação de sujeitos autônomos na relação com os meios de comunicação de massa (Gomes, 2010, p. 68).
As reflexões de Adorno e Horkheimer sobre cultura de massa e a indústria cultural sugerem que os meios de comunicação exercem influência determinista sobre o sujeito, fazendo com que o sujeito não seja capaz de resistir à pressão da mídia, ao mesmo tempo em que os meios de comunicação levam o sujeito a uma situação de heteronomia (no sentido da visão iluminista kantiana, de uma pessoa sem autonomia, que não é capaz de pensar por si própria e sem a ajuda de outra pessoa).
Em sua análise do que propõem chamar de Indústria Cultural, refletem sobre como a cultura está submetida à lógica da circulação da mercadoria. A Indústria Cultural se apropria de bens culturais (músicas, filmes, artes e outros) que, no contexto do capitalismo, passam a ter um papel potencial de mercadoria. O acesso a bens culturais (teatros, cinemas, museus, obras de arte, etc), antes restrito às elites, torna-se acessível as demais classes, gerando uma cultura de massas. O termo Indústria Cultural substitui então a ideia de uma cultura de massa (que se refere a toda manifestação cultural e artística oriunda do povo e para o povo). Não se fala mais em cultura de massa ou cultura popular, mas em Indústria Cultural, considerando sobretudo que a arte e a cultura passam a ser tratados como coisas ou objetos.
Todo e qualquer produto cultural, seja um filme ou um programa de rádio, não passaria de uma mera mercadoria submetida às leis de produção capitalista da mesma forma que quaisquer outros produtos industrializados.
A industrialização da cultura traz consigo uma visão de mundo carregada de ideologias, fruto da expansão tecnológica a serviço do capitalismo industrial. A função da indústria cultural é proporcionar lucro e entretenimento. Não há necessidade de que esse entretenimento seja vivenciado a partir de um senso crítico da realidade ou que gere reivindicações, exigências, mudanças de valores (sobretudo dos interesses dominantes). A indústria cultural se preocupa sobretudo em auferir rentabilidade econômica por meio da produção de cultura na condição de mercadoria, nem que para isso seja necessário suprimir o senso crítico da realidade.
Nesse contexto, a publicidade (e consequentemente os meios de comunicação) tem um papel crucial, pois é através dela que se procura convencer as massas da ideologia na qual se baseia a Indústria Cultural. A indústria cultural utiliza os meios de comunicação de massa como uma de suas ferramentas para manter e perpetuar seu nível de influência nas ações e decisões dos indivíduos. Ela passa a utilizar a publicidade, o marketing e os meios de comunicação para consolidar a sua visão de mundo: de que tudo tem um preço e pode ser transformado em mercadoria. Os meios de comunicação são os principais propagadores da ideologia, mas não de qualquer ideologia e, sim, da ideologia dominante, impondo às classes populares, menos favorecidas, sua manipulação.
Adorno e Horkheimer defenderão a tese de que as sociedades modernas, através da comunicação de massa e dos avanços tecnológicos, farão com que indivíduos deixem de ter uma razão crítica formada a partir de suas vivências e passem a ter uma razão técnica com sua formação em parte influenciada pela indústria cultural, criando assim uma padronização de pensamentos e vontades nas sociedades massificadas. Os pensadores denunciavam às consequências do sistema vigente, sobretudo, a evolução dos meios de comunicação causada pela modernidade e imposta pelo sistema capitalista. Acreditavam que a massa seria conduzida a partir dos meios de comunicação de massa, quanto mais acesso a essas ferramentas, mais suscetível aos estímulos os indivíduos estariam (Bezerra, 2021, p. 34).
Por isso Adorno e Horkheimer irão denunciar o capitalismo e a consequente mercantilização da cultura. Para os filósofos da Escola de Frankfurt, a função da indústria cultural não é a de deixar a vida dos homens mais humana: “toda racionalidade e progresso tecnológico são dedicados à reprodução do sistema econômico e não para resolver os problemas decorrentes da vida do ser humano” (Lima, 2020, p. 187).
Daí a crítica de Adorno ao que as pessoas podem aceitar e consumir àquilo que a indústria cultural oferece para a sociedade. Aquilo que é oferecido pelo teatro, pelo cinema. Uma influência que não é percebida pelas pessoas, mas que tem reflexos na vida política, social, cultural e até religiosa. Essa é uma crítica bem específica em Adorno que, mais até do Horkheimer, ao fazer a crítica da indústria cultural, se volta também para a crítica da arte. “Nesta sociedade, presidida pelo protagonismo inquestionável dos modernos meios mecânicos de reprodução, a arte tem se tornado um negócio, porque responde a uma necessidade social. Mas esta necessidade social não tem nada a ver com a experiência artística” (Lima, 2020, p. 180).
O que faz a indústria cultural com a arte, com a experiência estética e até com os indivíduos? A obra de arte é transformada pela indústria cultural: a arte é transformada em mercadoria e os indivíduos em meros consumidores, objeto para a indústria. “Dentro dessa linha de raciocínio, o indivíduo converte-se em um eterno consumidor que deve respeitar e acatar o que é fornecido neste sistema de mentiras, enganos e coisificação” (Lima, 2020, p. 187).
BEZERRA, S. de O. C. A Era Digital e as Previsões da Escola de Frankfurt. Boletim do Tempo Presente, v. 10, n. 2, p. 31-40, fev. 2021. Acesso em: 23 ago. 2025.
COSTA, Jean Henrique. A atualidade da discussão sobre a indústria cultural em Theodor W. Adorno. Trans/Form/Ação, Marília, v. 36, n. 2, p. 135-154, maio/ago., 2013. Acesso em: 03 out. 2025.
GOMES, J. V. L. Reflexões Frankfurtianas sobre o Impacto dos Meios de Comunicação de Massa. CSOnline – Revista Eletrônica de Ciências Sociais, ano 4, ed. 10, p. 55-70, mai./ago. 2010. Acesso em: 22 ago. 2025.
LIMA, G. de S. Adorno: A Crítica da Indústria da Cultura de Massa e a Alienação Imposta pela Mídia. Revista Contemplação, n. 22, Ed. Especial, p.167-190, 2020. Acesso em: 22 ago. 2025.