Johann Christofh Friedrich von Schiller 

por Alexsandro M. Medeiros

lattes.cnpq.br/6947356140810110

postado em: abr. 2023


Johann Christofh Friedrich von Schiller (1759-1805) foi um poeta, filósofo, historiador e dramaturgo alemão, considerado um dos principais representantes do Classicismo Alemão, do movimento Sturm und Drang (tempestade e ímpeto) e um dos grandes homens de letras da Alemanha do século XVIII, ao lado de Goethe (com quem manteve uma longa troca de cartas e com quem há um monumento em Weimar), Wieland e Herder.

Sua primeira peça, Os Bandoleiros, foi composta quando ele ainda iria completar 18 anos, em 1777, sendo publicada em 1781, numa edição própria. Essa peça marcou a imagem de Schiller na Alemanha e traz “uma crítica profunda à conjuntura alemã do século XVIII. A Alemanha era praticamente propriedade privada de príncipes e nobres e a rebeldia titânica da peça marca a revolta de Schiller a uma sociedade atrasada política e economicamente” (LIMA, 2014, p. 11). Além de Os Bandoleiros, Schiller escreveu inúmeras outras peças, como: Poesia Ingênua e Sentimental, Graça e Dignidade, Maria Stuart, além de uma Teoria da Tragédia composta por: “Kallias ou sobre a beleza (1793), um esboço do que poderia vir a ser a doutrina completa do belo em Schiller, os ensaios Acerca do sublime (1801), Acerca da razão por que nos entretêm assuntos trágicos (1792) e Acerca da arte trágica (1792)” (TOLEDO, 2008, p. 2).

A teoria da tragédia encontra em Schiller um momento importante para o seu desenvolvimento “por romper com a longa tradição canônica do gênero trágico e por conciliar os seus pressupostos com a filosofia kantiana, abrindo um novo e mais importante espaço para tal arte” (TOLEDO, 2008, p. 1).

Nas obras do poeta e filósofo alemão transparecem claramente valores iluministas como o Humanismo e a Razão. O iluminismo e, de certo modo, a própria modernidade, se caracterizou como um período da história onde houve uma supervalorização do uso da razão. Os ideais iluministas aliados ao grande desenvolvimento científico e tecnológico ampliou cada vez mais essa supervalorização. Esse projeto tem início já no século XVI com os filósofos racionalistas, dentre os quais merece destaque o filósofo francês René Descartes.

É nesse contexto que Schiller irá criticar a fragmentação resultante desse processo entre sensibilidade e racionalidade, propondo então a harmonia entre ambas. “A crítica feita por Schiller à fragmentação do homem, de suas disposições e da sociedade, é também o seu ponto forte, pois mesmo com essa fragmentação, só por meio desta, ele poderá elevar o seu estado de consciência” (NOBRE, 2016, p. 3).

Para Schiller, se a razão atingiu um grau adequado de desenvolvimento ou conduziu a humanidade um novo patamar de desenvolvimento, contudo, não elevou consigo a sensibilidade ao mesmo patamar. Sendo o homem um conjunto de sensibilidade e racionalidade, é preciso encontrar uma forma de harmonizá-las. O que será possível através de uma educação estética do homem: “uma educação em que sejam consideradas sensibilidade e racionalidade, onde a razão (que é livre), por meio de um conformar-se com a sensibilidade (que é necessária), entraria em uma perfeita harmonia” (NOBRE, 2016, p. 9).

Sua obra fundamental Série de cartas sobre a Educação Estética do Homem (Über die ästhetische Erziehung des Menschen em einer Reihe von Briefen), publicada em 1794, é ao mesmo tempo filosófica e literária, onde Schiller “busca um fundamento para o belo e para a arte, pois crê que é pela beleza que o Homem pode tornar-se verdadeiramente livre; é pela arte que a humanidade atinge sua destinação” (MONTEIRO, 1998, p. 10). A obra é composta de cartas, escritas entre setembro de 1974 e junho de 1975, publicadas na revista As Horas, respectivamente nos números 1, 2 e 6: “as nove primeiras, escritas em setembro e outubro de 1794 [...]; da décima a décima sexta, escritas em novembro e dezembro de 1794 [...]; da décima sétima a vigésima sétima, escritas entre fevereiro e junho de 1795” (MONTEIRO, 1998, p. 13).

Schiller e Kant 

Immanuel Kant foi um dos principais pensadores da modernidade e do iluminismo tendo, inclusive, escrito um pequeno tratado a este respeito intitulado: Resposta à pergunta: que é esclarecimento? Basicamente temos aqui a ideia de que o Esclarecimento (Aufklarung é a palavra alemã para traduzir o conceito de Iluminismo) é a saída do homem da sua menoridade, sendo a menoridade a incapacidade que o homem tem de fazer uso do seu próprio entendimento sem o auxílio de outra pessoa. Menoridade implica, assim, na incapacidade de pensar por si só. Eis uma das influências kantianas que encontramos na obra de Schiller, pois “Schiller recupera de Kant essa passagem quando compreende a educação como processo de esclarecimento estético-dialético” (LIMA, 2014, p. 38). O próprio Schiller reconhece a importância de Kant na construção de seu pensamento: “Não quero ocultar a origem kantiana da maior parte dos princípios em que repousam as afirmações que se seguirão” (SCHILLER, 1992, p. 36).

É na filosofia kantiana que Schiller irá encontrar os argumentos para desenvolver uma teoria, na modernidade, acerca da educação estética (que nós veremos adiante). “Sendo a faculdade de julgar, o juízo estético, o elo entre racionalidade e sensibilidade, entre liberdade e necessidade, seria ele o único capaz de devolver essa integralidade à humanidade” (NOBRE, 2016, p. 4). É a partir do estudo da Crítica do Juízo, de Kant, que Schiller irá encontrar a motivação para suas investigações estéticas. A Filosofia Transcendental kantiana procura investigar os fundamentos que garantem a possibilidade do ser humano conhecer inclusive do ponto de vista da estética e do belo.

Uma das questões centrais que perpassam o pensamento estético de Kant é a definição de juízo de gosto. Interessa a ele saber se o ambiente em que transita o belo é fundamentado por conceitos a priori, ou seja, se o juízo de gosto é dado através de conceitos ou determinado por uma ação subjetiva (MONTEIRO, 1998, p. 28).


Outro ponto onde encontramos a influência kantiana na obra de Schiller é sobre a questão da liberdade e os seus desdobramentos estéticos sobre o belo e o sublime. “O fato é que esses três termos andam atrelados às concepções kantianas a respeito dos mesmos. No entanto, Schiller vai além e busca desdobramentos que se estendem à moral, entendendo a estética como meio para a educação do homem” (TOLEDO, 2008, p. 3).

O homem é o único animal capaz de se determinar pela liberdade, ou seja, pela sua vontade e sua capacidade de escolha. Para Schiller, o homem não apenas é o único ser que pode escolher ou não seguir as determinações da natureza como pode, igualmente, transformar-se em gênio, usando dessa mesma liberdade, ou capacidade de escolha, para se expressar através da arte, como a pintura, a escultura ou a tragédia, por exemplo. “Similarmente ao belo natural [...] o gênio deve empregar uma originalidade em sua obra de forma que esta pareça existir apenas por si, como se fosse auto-suficiente – livre até daquilo que lembraria o próprio artista que a criou” (TOLEDO, 2008, p. 4). Através do belo o homem mergulha no mundo sensível e através do uso da sua liberdade o homem expressa o belo e o sublime. Mais uma vez é preciso recorrer à Kant para tratar da questão do sublime: “É em sua terceira crítica [Crítica do Juízo], na parte que trata da análise do sublime, que se encontra a concepção que terá profundas implicações na teoria da tragédia schilleriana” (TOLEDO, 2008, p. 5).

Notas sobre a Educação Estética de Schiller 

Vimos que Schiller procura desenvolver uma teoria estética buscando um elo entre a racionalidade e a sensibilidade, entre a faculdade de julgar e o juízo estético. Para Schiller o homem não é apenas razão, como também não é só sentido.

O impulso sensível assemelha-se a sensibilidade kantiana e representa toda percepção imediata dos sentidos: “parte da existência física do homem ou de sua natureza sensível, e está empenhado em submetê-lo às limitações do tempo, em torná-lo matéria, pois para isto já seria necessária uma livre atividade da pessoa que a recebe e distingue da própria atividade” (SCHILLER,1992, p. 76).

Agir baseado apenas por esse impulso só encontra diante de si as suas próprias sensações. É um impulso imprescindível para a existência humana, mas não representa a sua totalidade. Schiller não propõe, no entanto, a supressão do sensível, pois não há vida sem o impulso sensível, mas sim a sua educação, em conjunto com a educação do impulso formal ou racional.

O impulso racional compreende as relações dos objetos com o pensamento e representa leis eternas e imutáveis para o nosso agir: “fornece leis – leis para todos os juízos no que se refere a conhecimentos, para todas as vontades no que se refere aos fatos” (SCHILLER,1992, p. 78). O equilíbrio entre estes dois impulsos é o que Schiller tenta restituir através de sua estética. A educação estética propõe então pensar uma unidade entre os sentidos e a razão.

Ao criticar a ruptura promovida pela sociedade entre estes dois impulsos, Schiller “propõe um terceiro caráter ou impulso como mediador entre o impulso formal ou racional e o impulso sensível ou físico. Schiller nos remete ao impulso lúdico” (LIMA, 2014, p. 69). É o impulso lúdico que possibilitará a superação da “existência dicotômica do homem conduzindo-o ao equilíbrio, visto que ao ser educado o impulso sensível ou temporal reconhecerá a importância da razão como também o impulso formal irá reconhecer as determinações do impulso sensível” (LIMA, 2014, p. 69). O impulso lúdico aproxima a razão dos sentidos e os sentidos da razão.

O papel social da arte 

Para o poeta e filósofo alemão, a arte possui não apenas um papel social harmonizador e integrador, como suas ideias sobre o Belo e a Arte se relaciona intimamente com a questão política.

Poeta e filósofo, teórico e prático, Schiller como teórico busca pensar e responder ao problema do belo e da liberdade, ambos relacionados ao caráter estético do homem; como prático tem a proposta de resolver o problema da fragmentação individual e social, por meio do estético, possibilitando, pela educação formadora, uniformidade entre racionalidade e sensibilidade, entre individualidade e o Estado. Nesse sentido, podemos identificar, na proposta da estética de Schiller, essa função social e política, pois, por meio de conceitos teóricos, encontra soluções práticas contra a degenerescência social (NOBRE, 2016, p. 9-10).


A proposta estética-política de Schiller se funda em uma educação estética do homem, pois é através dessa educação estética como veículo de emancipação (saída do homem da menoridade) que podemos pensar o desenvolvimento cultural e social.

Na forma fragmentada com que o homem se encontra, não é possível se obter a paz social desejada. Só o homem integral, aquele que harmoniza razão e sensibilidade, é capaz de construir uma sociedade também harmônica.

Referências 

LIMA, Dalton Oscar Walbruni. Schiller, Educação e o Estado Estético. Tese (Doutorado em Educação), Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-CE, 2014.

MONTEIRO, José Dimas D’Avila Maciel. Friedrich Schiller em A Educação Estética do Homem: entre Razão e Sensibilidade; entre o Ideal e o Realizável; entre Platão e Aristóteles. Dissertação (Mestrado em Literatura), Programa de Pós-Graduação em Literatura, Universidade Federal de Sant Catarina, Florianópolis-SC, 1998.

NOBRE, Jaderson Gonçalves. A Educação Estética de Schiller: da Fragmentação à Integralidade Antropológica. Revista Lampejo, n. 9, p. 1-11, 2016. Acesso em: 16 mar. 2023.

TOLEDO, Ricardo de Oliveira. A “Teoria da Tragédia” de Schiller e “o Nascimento da Tragédia” de Nietzsche: um estudo comparativo. Revista Exagium, v. IV, p. 1-20, dez. 2008. Acesso em: 08 mar. 2023.