FARIAS BRITO
por Alexsandro M. Medeiros
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postado em abr. 2020
Raimundo de Farias Brito (1862-1917) é considerado como um dos maiores nomes do pensamento filosófico do Brasil sendo autor de uma vasta obra filosófica produzida originalmente em terras tupiniquins.
Farias Brito foi aluno de Tobias Barreto, na Faculdade de Direito do Recife, onde formou-se em Direito obtendo o título de Bacharel em 1884. Na Faculdade de Direito teve contato também com outros pensadores como Sílvio Romero e Clóvis Beviláquia. Além de atuar como promotor (no Ceará e no Pará) foi, por duas vezes, secretário no governo do Estado do Ceará, tendo uma forte atuação política, embora a política não tenha sido prioritariamente objeto de suas obras filosóficas. Em 1908 Farias Brito obtém a primeira colocação no concurso para a cátedra de lógica no Colégio Pedro II, mas ele não assume imediatamente. A razão é que o segundo lugar do mesmo concurso era ninguém menos que Euclides da Cunha, protegido do Barão de Rio Branco, que intercedeu a favor de Euclides. Como, porém, Euclides vem a falecer no ano seguinte, Farias Brito entra com uma petição que, após analisada por Sílvio Romero, ele passa “a ocupar a cátedra que lhe pertencia por direito, nela permanecendo até sua morte” (SILVA, 2013, p. 65).
É autor de obras que ele dividiu em duas séries: a primeira intitulada Finalidade do Mundo dividida em três volumes sendo: A Filosofia como Atividade Permanente do Espírito Humano (1895), A Filosofia Moderna (1899) e Evolução e Relatividade (1905); a segunda intitulada Filosofia do Espírito também dividida em três volumes sendo: A Verdade como Regra das Ações ( 1905), A Base Física do Espírito (1912) e O Mundo Interior (1914).
Em suas obras o filósofo brasileiro tratou de temas bastante diversos como: ética, o conhecimento e o ser, uma metafísica de caráter espiritualista e antipositivista, temas ligados à humanidade e questões existenciais. “O pensamento de Farias Brito é pampsiquista em seus fundamentos. Há no mundo duas ordens de fenômenos, diz ele: os objetivos de movimento e os subjetivos de consciência, correspondentes, respectivamente, à realidade física e à realidade psíquica” (VITA, 1969, p. 97).
Foi sua religiosidade quem mais o influenciou em sua escrita filosófica, propondo-se a combater o materialismo, a teoria da evolução e o relativismo, em favor de uma metafísica espiritualista – e sob certos aspectos de influência bergsoniana – como é possível perceber em sua obra O Mundo Interior. No seu pampsiquismo Deus é a razão do Universo, eterno, infinito, dentro do qual evolui continuamente o mundo finito. “Farias Brito asseverou convictamente: Deus é a luz [...] o Deus único e verdadeiro, a que se aplica a frase de S . Paulo nos ‘Atos dos Apóstolos’ (XVII, 28): in ipso vivimus, movemur et summus” (PEIXOTO, 1962, p. 12 – nEle vivemos, nos movemos e somos).
O Mundo Interior, sua derradeira obra é “considerada como a mais madura de seu pensamento [...] propõem, nesta sua última obra, a construir a filosofia do espírito no seu significado mais amplo e no seu sentido mais profundo” (SILVA, 2013, p. 65).
Farias Brito procurou aproximar Religião e Filosofia, fazendo da filosofia uma expressão conceitual do sentimento religioso e mais do que isso: “Para ele, a filosofia é atividade permanente do espírito humano para chegar ao conhecimento da verdade, que deve tornar-se a regra das ações humanas” (CASTAGNOLA, 1954, p. 293). A filosofia deve ser a chave para a interpretação do enigma do universo, da solução dos seus problemas, ao contrário da filosofia materialista que é a filosofia do nada, do desespero, por isso a verdadeira filosofia deve si erguer contra tal doutrina.
A Filosofia é um trabalho perene que o espírito assume no sentido de ver, com progressiva clareza, o mundo com totalidade e dentro da qual a consciência desenvolve sua atividade. Consciência e espírito se identificam. Trazer à luz aquilo que está encoberto e se apresenta ao homem como enigma é a missão essencial da Filosofia. Por isso mesmo, trata-se de uma atividade permanente e aberta ao infinito (MARQUES, 2006, p. 72).
Brito classifica como filosofias do desespero não apenas o materialismo, mas igualmente o criticismo (a filosofia de Kant), o positivismo (de Auguste Comte) e a anarquia.
O materialismo prevalecente no Brasil, quando Farias Brito escreve O Mundo Interior, é representado, particularmente, pelo positivismo em sua valorização de um método empirista e quantitativo, que tem na experiência sensível a fonte principal do conhecimento (JAPIASSU; MARCONDES, 2001), daí a sua aversão diante das teses positivistas (MARINHO, 2007, p. 13).
Somente uma filosofia do espírito poderia permitir a restauração dos valores morais em decadência no momento histórico e, por isso, a ética também encontra um lugar de destaque na obra do filósofo brasileiro, conforme aponta Silva (2013, p. 66):
perpassa toda a sua obra, desde a publicação do primeiro volume de Finalidade do mundo até sua última obra Mundo interior. Logo em sua primeira obra ele afirma que “as duas manifestações fundamentais do espírito humano na marcha geral da sociedade são a política e a filosofia. A política dá em resultado o direito, a filosofia dá em resultado a moral” [...] Farias Brito propõe um revigoramento moral, não interessa uma moral “especulativa”, considerada “ciência da ação”, mas sim uma “moral prática”, ou seja, uma “moral deduzindo leis e regulando os atos do homem”, uma moral da conduta.
No campo da ética encontramos algumas identificações de Farias Brito com o filósofo holandês Baruch Spinoza, autor da obra Ética demonstrada a maneira dos geômetras. O interesse por esta obra é, segundo Chauí (s/d, p. 6): “determinado pela união substancial entre Deus e o mundo, a partir da qual o autor chega a várias conclusões, algumas imediatamente compatíveis com sua doutrina e outras que ele trabalha para compatibilizar com seu pensamento”. Este interesse se deve também pelo modo como na Ética temos a busca do bem verdadeiro.
Referências Bibliográficas
CASTAGNOLA, Luigi. A Filosofia No Brasil. Divus Thomas, v. 57, p. 286-297, abr./jun., 1954. Acesso em: 20 abr. 2020
CHAUÍ, Marilena. Farias Brito: um espinosista nos trópicos [on line]. Acesso em: 21 abr. 2020.
FARIAS BRITO, Raimundo. O mundo interior. Ensaio sobre os dados gerais da Filosofia do Espírito. Uberlândia: Edufu, 2014.
MARINHO, José Antônio B. O renascimento da filosofia do espírito na visão de Farias Brito. Revista Educação, v. 2, n. 2, p. 10-16, 2007. Acesso em: 21 abr. 2020.
MARQUES, Oswaldo. Uma conversa com Raimundo Farias Brito. Revista Educação, I (2), p. 69-75, 2006. Acesso em: 20 abr. 2020
PEIXOTO, Matos. Farias Brito, filósofo. Revista da Academia Cearense de Letras, p. 11-22, 1962. Acesso em: 20 abr. 2020.
SILVA, Márcio José Andrade da. A ética em Farias Brito. Revista Estudos Filosóficos, n. 11, p. 61-72, 2013. Acesso em: 20 abr. 2020.