Os gregos tiveram uma concepção que se modificou através dos tempos, crenças e filosofias. Na Ilíada de Homero, Aquiles se depara durante a noite com o fantasma do amigo Pátrocles e daí conclui que a vida continua sob uma forma imaterial. O Hades é a região dos mortos que reservava para as almas justas um recanto feliz, os Campos Elíseos, enquanto o Tártaro acolhia os ímpios e os malfeitores.
A Ilíada é uma narrativa que descreve o cenário da Guerra de Tróia e, por isso, a menção a Hades e as divindades gregas não é tão presente na obra, diferente da Teogonia, de autoria de Hesíodo, que narra a gênese dos deuses.
Na Teogonia temos que Hades
é filho de Cronos e Réia. Irmão de Deméter, Hera, Héstia, Posídon e Zeus, foi, como seus irmãos, engolido por seu pai – à exceção de Zeus – e mais tarde vai lutar ao lado dos outros na guerra contra os Titãs. Na partilha do mundo, Hades fica com o mundo subterrâneo, e lá é que vai desempenhar as suas funções de deus dos mortos (Barbosa, 2012, p. 146-147).
Hades é o deus dos mortos. Seu nome – Άδης – significa “o Invisível” (Grimal, 2000, p. 189; Kury, 2009, p. 198). Se Zeus recebeu na partilha do universo após a vitória sobre os Titãs o domínio do céu e Poseidon o domínio do mar, à Hades coube o domínio do mundo subterrâneo, que “era separado do mundo dos vivos pelos rios Aqueronte, Cócito, Piriflegêton (ou Flegêton) e Estige” (Kury, 2009, p. 198).
Embora não houvessem rituais e cultos em sua homenagem – à exceção dos mistérios de Elêusis –, ou edifícios em sua honra, tinha um significado importante para os gregos, que consideravam a morte como um rito de passagem. Hades nunca recebeu um templo sagrado, ao contrário de Atenas, Apolo, Zeus, Poseidon.
Todos estes fatos e muitos outros nos são conhecidos através da mitologia grega. Para Grimal (1987, p. 7): “Temos neles [nos mitos gregos] um imenso material, muito dificilmente definível, de origem e características bastante diferenciadas, que desempenhou e ainda desempenha – na história espiritual do mundo – um papel considerável”. Os mitos movimentam forças ou seres considerados superiores aos humanos, se apresentam como um sistema de explicação do mundo e implica consequências sobre todo o Universo (sobre os mitos gregos, veja mais em: Mitologia Grega).
Mas não é só através dos mitos que os gregos antigos tinham profundas noções de espiritualidade. Filósofos como Pitágoras, Sócrates, Platão, são conhecidos por suas teorias filosóficas, místicas e até religiosas. Sócrates tinha de Deus uma concepção como uma “inteligência ordenadora” (Reale; Antiseri, 2007, p. 98), como podemos interpretar a partir da leitura do Fédon de Platão e, também, a partir do testemunho de Xenofonte (em sua obra Memorabilia). Logos, Espírito, Intelecto e Pensamento são alguns termos utilizados pelos gregos para representar o princípio organizador de todo universo. Discípulo de Sócrates, Platão nos legou uma das mais belas histórias de todo o pensamento filosófico ocidental: A Alegoria da Caverna. Através desta alegoria o filósofo revela de forma magistral a compreensão que ele tem da realidade, dividida em dois mundos: o mundo sensível, imperfeito, mutável, corruptível; e o mundo das ideias, perfeito, eterno, imutável. Essa ideia revela o caráter profundamente espiritual do seu pensamento. A caverna é o nosso mundo visível. Por meio da filosofia e de um amplo esforço intelectual, o filósofo se liberta do mundo sensível e ascende ao mundo inteligível das ideias e contempla a verdadeira realidade e o Sumo Bem, a Beleza Absoluta, o Bem Absoluto (veja mais em: A Alegoria da Caverna).
Referências Bibliográficas
BARBOSA, Leandro Mendonça. Hades na Ilíada: a formatação da morte no épico homérico. Revista Trilhas da História, Três Lagoas, v. 2, n. 3, p.146-157, jul./dez., 2012. Acesso em: 30 dez. 2018.
GRIMAL, Pierre. Dicionário de Mitologia Grega e Romana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
____. A Mitologia Grega. Tradução de Carlos Nelson Coutinha. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
KURY, Mário da Gama. Dicionário de Mitologia Grega e Romana. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009.
REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia: Filosofia Pagã Antiga. Tradução Ivo Storniolo. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2007. vol. 1, cap. IV, p. 91-120.