WILLIAM JAMES

por Alexsandro M. Medeiros

lattes.cnpq.br/6947356140810110

postado em ago. 2024

William James (1842-1910) foi um filósofo e psicólogo norte americano, conhecido como o “pai da psicologia americana” por ter sido o primeiro a oferecer um curso de psicologia nos Estados Unidos. É também considerado como um dos principais expoentes do pragmatismo, juntamente com filósofos como Charles Sanders Peirce e John Dewey. James se formou em medicina pela Harvard Medical School mas nunca praticou essa profissão. Em 1876 ele se tornou professor-assistente de psicologia ao lecionar sua primeira disciplina em psicologia experimental em Harvard no ano acadêmico de 1875-1876. Em 1881 assumiu o posto de professor-assistente de filosofia, tornando-se professor titular quatro anos mais tarde. Nesse período, James se juntou a um grupo de intelectuais de Cambridge, Massachusetts, conhecido como o Clube Metafísico (The Metaphysical Club), que promovia discussões filosóficas. Faziam parte deste clube: Charles Sanders Peirce, Oliver Wendell Holmes, Chauncey Wright e Nicholas Saint John Green.

 

[...] James foi um pensador poderoso, um dos grandes intelectuais do fim do século XIX e início do século XX, e um dos maiores filósofos das Américas [...] seu modo de filosofar contém possibilidades por muito tempo negligenciadas, estando entre suas principais contribuições para a filosofia uma teoria pragmática do significado, da verdade e da justificação. Junto com Charles Sanders Peirce e John Dewey, James estabeleceu o pragmatismo como um movimento filosófico, sendo ele, porém, possivelmente o mais famoso, mais controverso e maior responsável pela divulgação do pragmatismo (Pires, 2013, p. 12).

 

James teve interesse também nos estudos sobre paranormalidade e em 1882 se associou a recém fundada inglesa Society for Psychical Research, organização que o influenciou a fundar em 1885 a American Society for Psychical Research. James chegou inclusive a estudar uma médium chamada Leonora Piper e publicou um artigo na revista Science, em 1896, sobre o tema.

Suas principais obras são: Os princípios da psicologia (um texto inovador no campo da psicologia que aborda temas como a consciência, a vontade e as emoções); Essays in Radical Empiricism (uma obra de cunho mais filosófico); As Variedades da Experiência Religiosa (sua obra mais conhecida, onde investiga diferentes formas de experiência religiosa); e Pragmatismo (onde postula que as teorias científicas e filosóficas devem ser usadas como instrumentos a serem julgados por seus resultados ou fins).

É na obra Pragmatismo, composta de oito conferências e publicada em 1907, que James apresenta a sua sistematização filosófica do pragmatismo. Sobre esta questão, vale mencionar também a publicação, em 1909, da obra O Significado da Verdade, que tinha como intuito esclarecer mal-entendidos em relação às suas ideias.

O pragmatismo é, tanto um método, quanto uma teoria da verdade (como veremos mais adiante).

 

Pragmatismo

 

A filosofia do pragmatismo para James pode ser considerada como uma espécie de crítica, tanto do racionalismo (incluindo aqui o intelectualismo e o idealismo) quanto do ceticismo e até mesmo do empirismo (sensacionalista, materialista) e considera que toda e qualquer hipótese (científica, filosófica e até religiosa) deve ser investigada, desde que essa seja capaz de se mostrar concretamente útil. “Essa distinção entre o racionalismo e o empirismo é abordada por James mais pormenorizadamente em seus Ensaios em Empirismo Radical (JAMES, 1912), onde ele enfatiza o empirismo como o oposto do racionalismo” (Pires, 2013, p. 20). O debate em torno da oposição entre racionalismo e empirismo é o ponto de partida para a proposta do pragmatismo de James que consiste em oferecer uma filosofia que possa conciliar as duas posições ou, nas palavras do autor, “uma filosofia que não somente exercite os poderes de abstração intelectual [como fazem os “racionalistas”], mas que estabeleça alguma conexão positiva com o mundo real de vidas humanas finitas [como devem fazer os “empiristas”].” (JAMES, 1907, p. 9 apud Pires, 2013, p. 23).

O pragmatismo de James deve ser considerado como um método propriamente epistemológico de conhecimento. Diante da questão acerca do conhecimento sobre o mundo, “o ponto fundamental defendido por James é o de que o conhecimento deve ser entendido em associação à sua função, pragmática, de facilitar uma adaptação satisfatória ao ambiente” (Pires, 2013, p. 9). Literalmente, pragmatismo deriva do grego prágma e significa “fazer” no sentido de ação. Por isso, o pragmatismo pretende ser uma filosofia que conecta teoria e prática, pensamento e ação.

Ao mesmo tempo em que o pragmatismo critica diferentes formas de visão de mundo, ele também se harmoniza com muitas filosofias antigas, o que explica porque James “em suas conferências sobre pragmatismo fazia questão de reiterar que o pragmatismo é ‘um novo nome para os velhos modos de pensar’” (Nascimento, 2011, p. 42). Por isso, James acreditava ver indícios do pragmatismo tanto em Sócrates, como em Aristóteles, Locke ou Hume.

O Pragmatismo como Método 

A questão do conhecimento, seja no que diz respeito a natureza ou possibilidade de conhecer, sempre esteve presente ao longo de toda tradição filosófica e, “embora James não tenha se comprometido diretamente com o projeto de formular uma epistemologia, seu tratamento do pragmatismo toca profundamente em questões relativas à natureza e às possibilidades do conhecimento” (Pires, 2013, p. 9).

Nesse contexto, podemos dizer que a filosofia de James, como afirma Coelho (2022, p. 158), é tanto uma crítica do empirismo britânico, quanto uma crítica do racionalismo ou do idealismo de filósofos de Kant a Royce. Qualquer visão pode ser perigosa (intelectualista, racionalista, empirista), desde que não seja acompanhada do criticismo: “qualquer teoria ou doutrina é perigosa quando não acompanhada de criticismo” (Coelho, 2022, p. 160). Nesse sentido, o pragmatismo de James pode ser visto como uma alternativa ao dilema do racionalismo versus o empirismo.

 

A filosofia pragmática, conforme James, é uma via intermediaria entre as vias opostas do racionalismo e do empirismo, numa tentativa de conciliar divergências. James reivindica uma filosofia que não somente exercite os poderes da abstração intelectual, mas que estabeleça alguma conexão positiva com o mundo real, o mundo de vidas humanas finitas (JAMES, 1979). Assim, o método pragmatista consiste num instrumento para assentar as disputas metafísicas, uma vez que de outro modo, se estenderiam interminavelmente (Nascimento, 2022, p. 49).

 

A crítica de James se insere, portanto, dentro de uma visão que entende que a melhor forma de medir a eficiência de um conhecimento, seja ele baseado na razão ou na experiência, é saber em como esse conhecimento se adequa à realidade de forma concretamente útil. Embora faça crítica aos racionalistas e empiristas, James se identifica mais com estes últimos. O pragmatismo de James “defende que, no que tange ao conhecimento, todo elemento e toda relação entre elementos deve ser, ou potencialmente ser, experienciável. E essa postura filosófica ele denomina de empirismo radical” (Pires, 2013, p. 22). Para demonstrar a verdade ou a falsidade de uma teoria é preciso testar suas consequências na experiência. O descontentamento de James com o racionalismo se deve “por ser, segundo ele, ligado ao dogmatismo, às pretensões absolutistas e à desconsideração da experiência concreta. Esta teria prioridade no sistema jamesiano, mesmo que ele não rejeite a razão e a abstração” (Pires, 2013, p. 30).

O Pragmatismo como Teoria da Verdade 

Da mesma forma como o pragmatismo de James toca em questões relativas à natureza e às possibilidades do conhecimento, o mesmo pode ser dito em relação aos critérios de atribuição da verdade do conhecimento. James atribui à experiência uma espécie de função de teste da verdade, razão pela qual James teria repetidamente afirmado “que o pragmatismo é simplesmente um empirismo levado às suas conclusões legítimas. Dito isto, é na submissão das concepções ao controle da experiência, ao processo de verificação delas, que se encontram exemplos do que se chama verdade” (Pires, 2013, p. 15).

Dentro dessa visão utilitária e pragmática, por exemplo, no campo religioso, tais fenômenos devem ser considerados verdadeiros se mostrarem bons resultados. Se, por exemplo, a hipótese de Deus funciona satisfatoriamente, então deve ser considerada verdadeira. Considerando a questão do ponto de vista religioso, temos que:

 

Os filósofos, diz James, provaram que há argumentos consistentes dos dois lados da questão “ceticismo x metafísica”. Logo, se há argumentos racionais tanto para a crença quanto para a descrença, é irracional escolher teoricamente qualquer uma das opções (JAMES, 1956). A afirmação “É mais provável, ou mais racional que Deus exista/não exista” é desprovida de sentido. Por isso, a forma científica de se abordar a religião consiste em (1) observar o que ela é empiricamente, onde e quando se manifesta, quais são seus traços mensuráveis; e (2) julgá-las somente de um ponto de vista prático, ou seja, como a religião altera a vida dos que a “manifestam” e como altera a vida dos que não a manifestam (Coelho, 2022, p. 162).

 

A perspectiva pragmática enfatiza o caráter empírico de verdade pois esta deve estar amparada em eventos e efeitos concretos, muito mais do que em uma teoria que tenha base em uma autoridade ou até mesmo fundamentação teórica. “Isso porque ‘verdade’ é um signo de plausibilidade empírica de uma ideia, ao invés de mera consistência teórica, suporte por relatos e outros tipos de plausibilidade” (Coelho, 2022, p. 165). Pode-se, então, falar de uma espécie de empirismo pragmático. “A ‘verdade’ deve ser para ele o medidor da eficácia das ideias: em que sentido e em que medida a ideia se sustenta na prática. Verdadeiro é o conceito que funciona, que resolve problemas factuais, que faz alguma diferença no mundo da experiência” (Coelho, 2022, p. 166, grifo do autor).

 

E, em uma incomum admissão de relativismo, James compara grande parte das atividades intelectuais humanas à atribuição das formas das constelações. Ao olhar para o céu, chineses, índios e europeus veem diferentes imagens relacionadas às mesmas estrelas. Nenhuma delas é mais verdadeira que as outras, e todas são verdadeiras na medida em que representem bem aquilo que se vê nelas, que ajudem a orientar os viajantes e assim por diante. É claro, muitas de nossas atividades intelectuais não significa todas elas, mas a lição aqui é reconhecer que há espaço para diversidade de interpretações e que ela é até certo ponto algo com o qual temos de lidar (Coelho, 2022, p. 168, grifos do autor).

 

Este parece ser um exemplo bem ilustrativo. Um conjunto de sete estrelas pode ser designado como constelação da Ursa, no ocidente, ser representada como um dragão, na China, ou uma vasilha na América. Mas qualquer que seja a sua representação, ela tem como objetivo orientar aqueles que a observam. Se uma ideia, portanto, é adequada e útil, então ela é válida e considerada verdadeira para o pragmatismo ou, em outras palavras, temos aqui o valor de verdade de uma ideia: “a verdade corresponde ao que é vantajoso ao pensamento ou àquilo que gera uma relação satisfatória com a realidade, de tal forma que a vantagem e a satisfação estejam vinculadas ao que é útil, ao prático” (Nascimento, 2011, p. 47, grifos da autora).

Pragmatismo e Metafísica 

O empirismo radical de James deve ser aplicado não apenas em questões científicas e filosóficas, mas igualmente em questões metafísicas e religiosas. James não desconsidera o debate metafísica mas considera vazio qualquer debate metafísico que não produza consequências pragmáticas. “Consequentemente, em cada genuíno debate metafísico, algum problema prático, conquanto conjectural e remoto, está envolvido.” (JAMES, 1907, p. 36 apud Pires, 2013, p. 28).

James critica a metafísica da filosofia tradicional por ser, segundo ele, apartada do mundo real e da experiência concreta. Ao aplicar o método pragmático à noção de verdade e, consequentemente, ao campo metafísico, “esta só mantém o sentido de uma verdade epistêmica relativa ao nosso conhecimento de objetos e de relações experienciáveis, sujeita, tal qual estes objetos e relações, às imperfeições e efemeridades destes” (Pires, 2013, p. 30). Na filosofia pragmática não existe uma verdade metafísica absoluta.

Referências 

COELHO, H. S. O Pensamento Crítico: História e Método. Juiz de Fora-MG, Editora UFJF, 2022.

 

NASCIMENTO, E. M. M. do. Pragmatismo: uma filosofia da ação. Revista Redescrições – Revista on line do GT de Pragmatismo, ano 3, n. 1, p. 42-57, 201. Acesso em: 10 ago. 2024.

 

PIRES, M. da S. A. Epistemologia e Verdade no Pragmatismo de William James. Dissertação (Mestrado em Ensino, Filosofia e História da Ciência) Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História da Ciência, Universidade Federal da Bahia / Universidade Estadual de Feira de Santana, Salvador-BA, 2013.